sábado, 26 de novembro de 2011

VEJA BEM...

Congresso Nacional - Brasília - Imagem Pública do https://picasaweb.google.com/

Em 2008, quando fiz pós na UEL, na apresentação do trabalho de conclusão de uma das disciplinas, o professor nos perguntou, além do trabalho em si, coisas do tipo: o que você achou do trabalho, se aprendeu alguma coisa, o que vai acrescentar na sua vida dali para frente ou quais as dificuldades que encontrou na realização da tarefa. E nos proibiu, já de antemão,  que na resposta a cada questionamento, que disséssemos algumas palavras, tais como “com certeza”, “interessante”, “na realidade”, “na verdade” ou “veja bem”.  A alegação dele foi de que são palavras vazias, que nada exprimem, e que são usadas a todo instante, por todo mundo, quando não se tem muito que dizer, ou quando não se encontram outras palavras. 

Lembro-me que pareceu banal o que ele pedia, mas que ficou bem difícil de responder às questões, ficou. Quando percebíamos estávamos começando a dizer “na realidade”, ou “com certeza”.  Daí parávamos, e todos ríamos. 

Vou pegar, por exemplo, a expressão “com certeza”.  Pode notar que ao invés de um simples “sim”, na maioria das vezes escutamos um “com certeza”. E pior: às vezes nem cabe no momento. 

Quer ver? 

Jogador de futebol. O repórter pergunta  ao Liedson o que ele achou do jogo no primeiro tempo? Ele responde: - Com certeza.  Depois é que o jogador vai falar alguma coisa a mais. Chego a pensar que “com certeza” nasceu no mundo futebolístico. Também (sem preconceito) jogador de futebol a maioria lida mal com o português, ou melhor, sabe se expressar muito pouco em palavras. Contudo, acho que até passa, afinal o que nos interessa é que ele ajude o time chegar à vitória, não é mesmo? Dureza é quando o “com certeza” sai do campo de futebol.

Hoje, quando estava indo para a aula de pintura, estava ouvindo um médico, num programa da  CBN, e lá pelas tantas até ele usou o “com certeza”. Não que ele seja proibido de falar, mas não cabia muito ali na fala. 

A maioria dos “com certeza” é ouvida nos meios de comunicação como a TV e o rádio. Daí se estende para a conversa do dia-a-dia, seja presencial, seja virtualmente. Boa parte dos jornalistas ou apresentadores atuais fazem as perguntas ao entrevistado já contendo as respostas. Antigamente, o entrevistador fazia uma pergunta pequena, simples, querendo saber o que o outro tinha a responder sobre. Hoje, a pergunta chega a ser uma afirmação completa, e o entrevistado limita-se a dizer “com certeza”. Exemplo: - Você não acha que no primeiro tempo o jogador Fulano estava muito deslocado da posição normal dele e por isso o time não rendeu o esperado pelo técnico?  Uma pergunta com a resposta acoplada, e que, com certeza, o jogador vai responder - Com certeza. Acaba aí a entrevista (hehe).

Outra palavra também por demais utilizada é “interessante”. 

O que você achou do final da novela das 9?  Resposta: - interessante

O que você achou  desta comida? Resposta: - interessante

O que você acha de mim? Resposta: - interessante.

Diga sinceramente: são respostas? São, só que vagas. Em nenhuma dá para saber a opinião do outro. "Interessante" pode ser tanta coisa como pode ser nada, quando não se sabe o que responder.

O que dizer do “veja bem”? Se você quer enrolar alguém, comece com “Veja bem...” Você começa sugerindo, de cara, que o problema é que a pessoa não está entendendo a situação.

Acho que a expressão surgiu no Congresso. Pode notar que quando um parlamentar é inquirido em alguma questão delicada, como propina, loteamento de cargos, ou maracutaias do gênero, ele inicia a sua resposta com um “Veja bem...”. Pode esperar que ele vai tentar enrolar o entrevistador. 

Sabe, não sou contra o “com certeza” nem tampouco o “interessante”. Só que concordo com o professor. O que naquele momento ele estava nos querendo dizer é que no mundo corporativo (estudávamos com foco nele) não cabem meias palavras, ou frases sem conteúdo. Quando estamos especificando um produto, ou nos posicionando sobre determinado problema da organização, cabe a nós nos expressarmos claramente. Ao invés de dizermos que foi interessante fazer o trabalho, poderíamos dizer, por exemplo,  que a realização do trabalho propiciou-nos o aprendizado de uma ferramenta nova de especificação de um produto (no caso software) e que doravante tentaremos utilizá-la na empresa,  nos próximos projetos.

Fico pensando que, enquanto as expressões são utilizadas fora de casa, até passa. Triste é quando perguntarmos para o nosso companheiro, depois que a gente se produziu toda para sair com ele, o que ele achou do resultado final e ele responder:  - Interessante. Ou se tivermos que dizer - você não achou que valeu a pena esperar eu me arrumar, ficar linda e maravilhosa para sair com você? para ele responder - Com certeza 

Aí será o fim do mundo!

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