segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

TER OUVIDOS PARA OUVIR

Colheita de trigo - estrada Apucarana - Califórnia - PR

A gente tem que ter olhos para ver e ouvidos para ouvir. Não necessariamente físicos, mas necessariamente da alma.

Tive um colega de trabalho que, quando eu contava de problemas que tinha com porteiro do prédio onde morava, tais como falta de colaboração ou displicência, me dizia: “se o porteiro fosse capaz de entender, ou responder ao solicitado, não estaria trabalhando de porteiro.”

Por vezes até correspondia mesmo com o que o meu colega justificava. Mas, atualmente, no meu prédio, tenho exemplo contrário. E a cada dia, vejo que já não cabe mais essa máxima, em várias outras profissões.

Tem um monte de gente boa trabalhando em serviços para “menos capacitados”. Tem muita gente batalhando em serviços “menos nobres”, para alcançar um objetivo muito nobre, como por exemplo, complementar a renda para pagar o estudo de um filho, e no caso de um de nossos porteiros (que está substituindo o de férias), para pagar o seu próprio estudo – Medicina Veterinária.

A mulher já é Veterinária e trabalha como tal em uma empresa. Ele, trabalha de porteiro, pelos horários que lhe permitem continuar os estudos. E se desloca para a cidade vizinha, onde fica a faculdade.

Para somar a isso, o casal é gaúcho, de Passo Fundo, e veio pra cá pela oportunidade que a mulher teve, na sua profissão. Ela realizara o mesmo sonho de fazer Veterinária, anos antes na sua cidade, com o marido custeando parte da faculdade, com a bolsa que a empresa dele fornecia. Primeiro ele a ajudou, agora está sendo a vez dela.

E fiquei sabendo de tudo isso, quando passei pela portaria e perguntei pelo meu carnê do IPTU. Na conversa que tive com ele, soube que estava lendo um livro, por estar tranquilo o dia. 

Derrubou inteiramente a tese do meu colega.

Derrubou a tese de conhecidos meus que me dizem que não tiveram oportunidade de estudar, ou que não têm tempo, ou que.... blá, blá, blá....

Está certo que não posso ser tão simplista assim, que cada um "sabe a dor e a delícia de ser o que é", mas quando a gente escuta uma história como a do porteiro, a gente pára pra tentar entender as razões do que não estudou e do que não procurou melhorar na vida.

E fico pensando até onde vai o preconceito de quem vê em profissões como a de porteiro, uma opção de quem não tem capacidade para mais.

Adorei ouvir a história de vida do nosso colaborador, contada com uma simplicidade e uma alegria que por vezes não vejo em muitas pessoas em cargos para “mais capacitados”, em profissões “mais nobres”. E o que dizer da paciência, da resignação e da perseverança do casal, incentivada pela esperança e pela fé em dias melhores? Uma lição e tanto!

Esta postagem é um contraponto da que fiz dias atrás, sobre o Brasil do Bolsa-Família.  Existe o Brasil batalhador, formado por pessoas como o porteiro do meu prédio, que quer  um lugar ao sol, que luta pra isso, que faz parte do Brasil que lê, porque quer ser protagonista do seu próprio futuro.

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