A belíssima capa do belíssimo livro. |
Ganhei de presente de meus pais o último livro do Domingos
Pellegrini – “Herança de Maria”, dias atrás, quando eu retornava de Curitiba.
Se há uma coisa que agradeço a eles, nesta e nas próximas encarnações, é o fato de eles terem me incentivado à leitura,
desde os primeiros dias de escola, com os livros de histórias infantis,
comprados de livreiros (mascates) que vinham vender na porta de casa, e morando
em uma cidade tão pequena que nem existe no mapa. No meio do mato mesmo! (hehe)
Penso que o gosto pela leitura substitui, em parte, a
impossibilidade de viajar; permite-nos voltar no tempo, ao encontrarmos nossas lembranças nas obras,
ainda mais se o escritor for nosso contemporâneo; abre nossa mente para o diferente, ajudando-nos a
quebrar paradigmas e preconceitos; faz-nos companheiros de nós mesmos (se não
nos aguentarmos lendo um livro, é melhor procurarmos um psicólogo); irmana-nos em
gostos e pensamentos a milhões de pessoas que estão a ler o mesmo livro;
transforma-nos em agentes de conhecimento; faz-nos privilegiados, uma vez que
muita gente sequer tem disponibilidade para uma leitura, seja por doença, por
dificuldade de ordem financeira, de ordem moral, de tempo, de cabeça, de
entendimento, ou sei lá o que.
Pois, neste momento, encaixo-me em muitas das situações que
coloquei acima, e destacadamente por estar lendo outra obra de meu conterrâneo e
contemporâneo. Sim, Domingos Pellegrini é um “pé-vermelho”, como eu!
Quando li “Terra Vermelha”, dele também, fiquei na dúvida se
tirava ou não do topo, outro livro que elegi como o que mais gostei até hoje –
“Cem Anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez.
“Cem Anos” ocupou, por muitos anos, lugar de destaque na minha
sala, como um objeto de estimação: eu o lera três vezes.
E, com ele, elegi também um dos tipos de livros que mais gosto de ler:
os que falam de sagas de família. Os que contam histórias de gente que casa,
que descasa, que briga, que faz as pazes, que muda de cidade, que lida com os
mais variados tipos de sentimentos, que enfrenta todo e qualquer tipo de
alegria e de tristeza, por gerações e gerações. É que gosto de me ver, e de ver
minha família, nas outras famílias. As repetições, as lições, os porquês de
sermos de um jeito e não de outro, os “espelhos”. Gosto de entrar na história e
deixar que a história também tome conta da minha, com todos os “fantasmas” dos
personagens passando uns dias na minha casa. (hehe)
“Terra Vermelha” levou-me aos meus avós, ao meu passado, que
como os avós do Pellegrini, trilharam caminhos muito parecidos. A vinda do Estado de São Paulo, passando pelo rio
Tibagi, os carregamentos de toras em carroças (tive um tio que morreu em um
desses carregamentos), muita barreira (de barro mesmo!), muita luta, muito
trabalho a fazer, e trabalho que deixou marcas
na vida da minha família, tanto boas, quanto ruins. Falo pela minha irmã e por
mim: a garra do povo do norte do Paraná fez diferença nas nossas vidas. Se
crescemos profissionalmente, por exemplo, é porque tem muito das histórias que
o Pellegrini conta em seus livros, na
nossa vida.
No “Herança de Maria” não é diferente. O escritor conta a
história de sua mãe, narrando as lembranças que tem e que agora "vê" projetadas na parede do quarto dela. Lembranças essas acompanhadas de "cobranças", ele sentado em um banco ao lado da cama onde o corpo da mãe vegeta, no leito de morte. E essas histórias, além de me levarem à casa
dos avós novamente, levaram-me à casa de
meus pais, eles, em vários aspectos, muito parecidos com os pais do autor. Uma mãe que queria dar conta de muita coisa da
nossa vida e do marido. E um pai que deixou as "rédeas" da casa por conta dessa
mãe, e que depois de velho não sabe mais lidar com a "carroça desgovernada". Mas
também, não sabe se quer mesmo! (hehe)
E mais: saindo do campo familiar, Domingos Pellegrini conta
como eram as reuniões quando se engajou tanto na política estudantil, quanto
nos “quadros revolucionários” que “lutavam” por um país “livre da opressão e da
miséria”, e que nos dão a medida certa de quão utópicos, hipócritas e
oportunistas são o comunismo e os partidos dele oriundos (formados pelos
companheiros “da causa”). Imperdível! Uma aula de História e de Brasil!
Estou a um terço do final do livro, embora tenha começado a
lê-lo há 15 dias. Também... parando pra destacar trechos, pra rir, pra chorar,
pra reler e meditar sobre as falas, pra tomar um fôlego dos “fantasmas” todos
na minha casa. (hehe). Mas de uma coisa já tenho certeza: vou terminar o livro
e vou relê-lo. Talvez não todo, mas os trechos que destaquei justamente com
essa finalidade.
Um monte de gente cabe nas histórias do Pellegrini. Um
monte. Só por isso já vale a pena ler seus livros, tão cheios de vida, tão
cheios de gente com vida!
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