sexta-feira, 8 de junho de 2012

UM MOTIVO PARA SORRIR


www.jornale.com.br - Ruy Barroso

No ano passado visitei dois lares de idosos, que funcionam um ao lado do outro, aqui em Londrina. Iguais ao que eu fui, há muitos outros espalhados pelas cidades do Brasil e do mundo.

Nesses lares há idosos que não têm família; há os que têm, mas a família não tem disponibilidade de tempo e até mesmo vontade de ficar com eles; há os que resolvem ir por conta própria, por não se darem bem com seus filhos, ou por se sentirem fardos (a mais) para seus próximos mais próximos; há os que nem têm noção de que estão ali, pois estão “em outro mundo” criado e mantido por eles mesmos; há os que têm problemas de locomoção ou são doentes e carecem de cuidado o tempo todo, e que não o teriam em casa; enfim, há pessoas com “n” motivos para estarem ali.

Esta semana, fui a outro, numa cidade vizinha, por conta de um trabalho voluntário que faço.

Sabe, que saí pensativa de lá.

O Lar fica de tal maneira no terreno, que não dá para ver a rua. O terreno é pequeno, mas para chegar até a casa, passamos por um jardim com flores e árvores. Ainda bem! O pessoal que os atende me recebeu com muito calor humano e alegria. 

Mas sabe, saí pesarosa de lá.

Estava chovendo, como hoje, frio, cinza,  tudo muito úmido. Alguns dos idosos estavam sentados na varanda, com olhares tão tristes! Passei por eles, os cumprimentei e a maioria ficou me olhando sem nada dizer. Fico pensando que não deveria haver dias cinzas e chuvosos nos locais onde abrigam velhinhos e velhinhas assim.

Dentro da instituição, as lâmpadas fraquinhas, os idosos na penumbra, sentados em sofás, ou perambulando de um lado a outro.

Enquanto eu conversava com a moça que trabalha na instituição, passa uma senhorinha e diz pra mim: “Estou aqui já faz um tempão. Eu moro aqui, viu.” A moça olhou pra ela, confirmou sorridente, e continuou a me atender com uma atenção de fazer sombra pra muita balconista de loja.

O meu pesar foi por aquelas pessoas, seres humanos, vendo a vida passar, tristes, num lugar úmido e escuro. Coloquei-me no lugar delas, e vi que morreria logo se vivesse assim.  Já não gosto de dias frios, chuvosos e cinzas (não é à toa que me mudei de Curitiba para cá), quanto mais se tivesse que viver em um lugar que não é meu, no qual não posso dizer que sou dona de um simples copo da cozinha, sem pessoas da família por perto, com um tempo enorme pra ficar “ruminando” o passado, e volto a dizer, em um lugar escuro, no fundo de um terreno. E aí, qual o motivo que eles teriam para estarem alegres? Deus meu! O inferno é aqui na Terra mesmo!

É em lugares assim que a ficha da gente cai.

Corremos tanto atrás de poder, de status, de “um lugar ao sol”, e boa parte das vezes chegamos lá, ficamos torrados de sol, mas ainda reclamamos de um monte de coisas. De que a comida não está boa, de que estamos trabalhando demais, de que estamos estressados, de que não podemos sair porque não temos roupa, de que não temos tempo pra nada, de que fulano não colabora, de que não temos sorte só porque uma coisinha de nada não deu certo. Deveríamos sempre visitar abrigos de idosos pra ver o que é sofrimento. Pra ver que a nossa vida é simplesmente maravilhosa, mesmo a comida tendo saído salgada, mesmo o nosso companheiro tendo  discordado da gente, mesmo que estejamos estressados pelo trabalho (ainda bem que temos um!), mesmo quando o que a gente queria tanto não deu certo.

Sabe... li em algum lugar que se a gente quer  comparar a nossa vida com a de outra pessoa, que olhemos para baixo, e não para cima. Seguramente vamos ver a nossa vida com outros olhos: mais receptivos, com menos severidade, com mais complacência. E mais: vamos aprender a ter compaixão pelo outro. E compaixão de qualquer forma, pois muitos idosos vão para esses lares porque uma vida inteira foram algozes de suas famílias, e estão tendo o retorno. Sim, não sou ingênua em colocar toda a culpa nos familiares e na sociedade pela estada desses velhinhos nessas instituições. Cada qual tem o seu quinhão, sua parcela de responsabilidade por suas vidas. E a maior parcela, não nos esqueçamos, é a da gente mesmo. 

Contudo, apesar de ter saído pesarosa do Lar, quando me lembro dele, me vêm à mente as pessoas que se dispõem a cuidar daqueles velhinhos. Se os velhinhos não têm motivos pra sorrir, quem cuida deles tem pelo menos um: a caridade que fazem, embora remunerada. 


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